Mais de uma década atrás, Qu’ana Underwood, então estudante do ensino médio da Filadélfia, entrou no Facebook. Mas, à medida que outras plataformas de mídia social foram aparecendo, este “tornou-se um mero reflexo do passado”, segundo a jovem.
Então, este mês, depois que Qu’ana postou fotos de si mesma em um baile da universidade no Instagram, ela foi repentinamente inundada com notificações no Facebook de parentes e amigos com os quais ela não falava há meses.
Qu’ana não conseguia entender porque cada postagem ou história que ela compartilhava no Instagram acabava indo parar no Facebook — embora ela não conseguisse se lembrar da última vez que postou qualquer coisa lá.
— O que está acontecendo? — indagou a jovem de 22 anos, hoje uma especialista em saúde comportamental que vive em Nashville, no Tennessee.
Como Qu’ana, outros adolescentes e jovens adultos descobriram nos últimos meses que têm sido extraordinariamente ativos no Facebook — mesmo sem terem sequer aberto o aplicativo.
Configuração induz a aceite automático
Alguns ficaram chocados, disseram eles, porque não usavam o Facebook há anos e estavam recebendo comentários de amigos da rede social que haviam esquecido, sem ter nenhuma ideia de como impedir que suas postagens no Instagram acabassem na rede social mais antiga.
O aumento na atividade na rede social está enraizado em um novo recurso da Meta, dona do Facebook e do Instagram. No ano passado, a Meta introduziu um aviso que aparecia no Instagram quando as pessoas postavam uma foto ou história. O prompt perguntava aos usuários se também queriam compartilhar sua postagem no Facebook.
Para fazer com que o prompt desaparecesse, os usuários precisavam clicar em um grande botão azul para concordar em compartilhar suas postagens do Instagram no Facebook ou em um hiperlink menor para cancelar.
Muitas pessoas, incluindo Qu’ana, clicaram no botão azul mais visível — e imediatamente se esqueceram dele, de acordo com entrevistas com mais de uma dúzia de usuários das gerações Z e Y do Instagram.
Inverter a configuração requer clicar em vários menus da rede social de compartilhamento de fotos e vídeos.
— Parece tão sorrateiro — afirma a gerente de mídia digital de 28 anos, Ashley LaBossiere, que teve problemas para desligar a configuração.
Botão onde o polegar encosta na tela
A Meta há muito tempo vem se preocupando em perder adolescentes e jovens adultos para rivais como TikTok e Snapchat, especialmente porque esse público é altamente cobiçado pelos anunciantes. O Facebook, que Mark Zuckerberg criou em 2004 enquanto estava na Universidade de Harvard, era voltado para estudantes universitários em seus primeiros anos, mas tem lidado atualmente com uma base de usuários envelhecida.
No ano passado, 17% dos usuários do Facebook tinham entre 18 e 24 anos, em comparação com 44% com mais de 45 anos, de acordo com a empresa de análise Data.ai.
Em contraste, 28% dos usuários do Instagram tinham de 18 a 24 anos e 33% tinham mais de 45 anos, enquanto 39% dos usuários do Snapchat e 30% dos usuários do TikTok tinham entre 18 e 24 anos.
Para atrair usuários mais jovens, o Instagram e o Facebook introduziram nos últimos anos alguns recursos, como o Stories, que emula um recurso do Snapchat permitindo que as pessoas postem fotos e vídeos que desaparecem após 24 horas. Eles também lançaram o Reels, recurso semelhante ao TikTok que permite que as pessoas criem vídeos curtos.
No ano passado, os engenheiros do Instagram foram informados de que a Meta queria que mais pessoas postassem coisas do Instagram no Facebook, disseram três pessoas envolvidas com o projeto, que não estavam autorizadas a falar publicamente.
Isso levou ao novo prompt, que foi projetado para que a maioria dos usuários desse permissão para compartilhar permanentemente suas postagens do Instagram com o Facebook, contaram. O aviso foi colocado onde os polegares normalmente tocam na tela, disse uma das pessoas.
A Meta se recusou a comentar o que levou ao prompt e ao seu design. Mas a empresa disse que nem todos os usuários do Instagram receberam o prompt. A Meta também disse que um bug de software no ano passado fez com que alguns usuários vissem o prompt sempre que postavam no Instagram.
“Sabemos que as pessoas gostam de postar conteúdo cruzado para compartilhar facilmente com seus amigos e seguidores em nossos aplicativos”, disse em um comunicado um porta-voz da Meta, que também possui o WhatsApp e o Messenger.
Design estratégico para fidelizar clientes
As empresas de tecnologia há muito incentivam os usuários a permanecer fiéis a seus serviços aprimorando seus produtos, disse Tony Hu, professor de design de produto no Instituto de Tecnologia de Massachusetts.
Um exemplo, segundo ele, são as janelas pop-up que as pessoas clicam uma vez para aceitar todos os cookies da Internet, que coletam seus dados e os rastreiam on-line. Outra é como a Amazon facilitou a compra de itens com apenas um clique, acrescentou.
Referindo -se ao prompt de Meta, Hu disse:
— Talvez eles estejam apenas cutucando as pessoas a compartilhar porque isso impulsiona sua audiência, receita de anúncios.
Para alguns adolescentes e jovens adultos, desfazer o compartilhamento dos posts do Instagram no Facebook se tornou um grande problema.
Post sobre mães narcisistas no Facebook
Em janeiro, Ashley LaBossiere correu para excluir um post sobre as mães narcisistas que ela havia compartilhado no Instagram e acabou indo parar em seu perfil no Facebook, porque ela não queria que os amigos de sua mãe o vissem.
Como gerente de mídia social, Ashley se considera experiente em tecnologia, mas perdeu a conta das vezes em que se recusou a compartilhar do Instagram para o Facebook, apenas para fazê -lo acidentalmente novamente, disse ela:
— Talvez eu não saiba o que estou fazendo. É quando eu começo a me sentir com 100 anos.
Mia Bramel, engenheira de software de 23 anos que vive em Santa Clara, Califórnia, disse que deliberadamente mantinha suas contas do Instagram e do Facebook separadas. No Instagram, ela normalmente compartilha fotos da natureza e vídeos de si mesma praticando peças de piano. No Facebook, que ela usa com menos frequência, compartilha atualizações de vida como se formar na faculdade.
— Eu sempre quis ter ciência de quem está vendo qualquer coisa – disse ela. – As coisas que publico no Instagram são realmente realmente destinadas às pessoas que me seguem. Se estivesse no Facebook, seria realmente estranho.
Agora, uma selfie ou um post “artístico e experimental” do Instagram às vezes acaba no Facebook. Isso faz parecer mais difícil “controlar” sua presença nas mídias sociais, disse Mia.
Facebook para família, Instagram para amigos
Outros, no entanto, adotaram o compartilhamento de postagens do Instagram no Facebook. Loren Cantor, estudante e músico de 22 anos de Montreal, disse que o novo cenário foi uma “surpresa agradável” porque o ajudou a manter contato com a família.
Em 2011, Cantor ingressou no Facebook, onde seus amigos mais ativos são sua família. Dois anos depois, ingressou no Instagram, onde, entre seus seguidores, há amigos da escola e do mundo da música. Quando começou a postar acidentalmente, começou a ver mais comentários de sua avó e tia.
— O Facebook é uma coisa mais orientada para a família, para as gerações mais velhas que não estão nesses outros aplicativos. Eu realmente não sei o que está acontecendo no Facebook — acrescentou o jovem músico.
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